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quarta-feira, 23 de outubro de 2013




Vestígios de uma penumbra
Tênue vermelha
Que espelha aromas de framboesas
Fragmentos de batom
Filamentos de uma quase opaca
Luz de abajur
Versos numa gaveta semi-aberta
De um azul turquesa
Morangos estragados
Pedaços que foram mordidos
Mastigados
Taças quebradas
Lapsos de vinho tinto
Derramados
Cápsulas pílulas drágeas
Maços vazios amassados
Um vinil de fado
Pétalas de papoulas machucadas
Um laço desfeito encarnado
Pedaços de um livro de poesia
Cordas quebradas de uma viola
De Andaluzia

O espelho trincado
Reflete as ilusões do passado
Que não podem mais ser
Conjugado no presente
Nem refletido no olhar
Nem delineado de frente
Nem nas lentes dos óculos
Nem nas distorções do espelho

Um vaso afoga um buque
De flores
Hastes pendidas
Um invólucro de chocolate
Reminiscências das mordidas
Mostrando a grande paixão
Antes da despedida
Daquela abrupta partida
O vento dialoga todo o tempo
Com aquelas porta entre – aberta
E as lembranças que ficaram
Lá dentro...


             Luiz Alfredo - poeta



terça-feira, 22 de outubro de 2013

Lobo Extinto


Reminiscências do meu lobo da floresta
Verde
Que me levava para contemplar as estrelas
Cintilantes
A lua cheia
Comungar seus raios poéticos
Uivar nas orlas dos seus mares
Adormecidos
Suas marés bravias
Sombrias
E domar na madrugada bruxuleante
Com seus vaga-lumes e
Mariposas atordoadas
A fera que rosnava dentro
De mim

Tempo que meus olhos brilhavam
Como duas lamparinas 
Na escuridão
Enxergando seus mistérios
Suas entranhas
E ela com seus tímpanos silenciosos
Escutava meus uivos
Laivos e lamentos

Hoje contemplo do meu apartamento
Transeuntes nos seus cruzamentos
Apressados
Cruzando avenidas
Que levam suas vidas
Para lugar algum

Fico ali da janela
Alimentando minhas retinas
De meteoros
Restos de turbinas
Comendo pedaços de lua
Nubladas pelas chaminés
E vapores das fábricas
E dos suores dos operários
Que trocam seus sangues
Por míseros salários

Vislumbro antenas de alumínios
Nos telhados solitários
E aqueço meu olhar nas telas
De um computador
A metafísica de Aristóteles
Não conjectura sobre a solidão
Do lobo
Nem que o logos da minha ocidentalidade
Mergulharia meu ser nas aporias
Desta cidade

E tirou meu animal
E seu faro
Da minha ancestralidade.


                  Luiz Alfredo - poeta





domingo, 20 de outubro de 2013

Torso de Apollo












Archaïscher Torso Apollos

                                   RAINER MARIA RILKE
                                                  poeta

Wir kannten nicht sein unerhörtes Haupt,
darin die Augenäpfel reiften. Aber
sein Torso glüht noch wie ein Kandelaber,
in dem sein Schauen, nur zurückgeschraubt,
sich hilt and glänzt. Sonst könnte nicht der Bug
der Brust dich blenden, and im leisen Drehen
der Lenden könnte nicht ein Lächeln gehen
zu jener Mitte, die die Zeugung trug.
Sonst stünde dieser Stein entstellt and kurz
unter der Schultern durchsichtigem Sturz
and flimmerte nicht so wie Raubtierfelle;
und bräche nicht aus alien seinen Rändern
aus wie ein Stern: denn da ist keine Stelle,
die dich nicht sieht.
Du musst dein Leben ändern.

Torso arcaico de Apollo


Não sabemos como era a cabeça, que falta,
De pupilas amadurecidas, porém
O torso arde ainda como um candelabro e tem,
Só que meio apagada, a luz do olhar, que salta
E brilha. Se não fosse assim, a curva rara
Do peito não deslumbraria, nem achar
Caminho poderia um sorriso e baixar
Da anca suave ao centro onde o sexo se alteara.
Não fosse assim, seria essa estátua uma mera
Pedra, um desfigurado mármore, e nem já
Resplandecera mais como pele de fera.
Seus limites não transporiam desmedida
Como uma estrela; pois ali ponto não há
Que não te mire. Força é mudares de vida.

Tradução de Manuel Bandeira


Torso arcaico de Apolo

Não conhecemos sua cabeça legendária
na qual as pupilas maturavam. Porém
seu torso ainda arde como uma luminária,
em que seu olhar, mais tênue, se detém,
fica e brilha. Senão o leve reflexo
da curva do seu peito não te cegaria,
nem o sorrir, no giro dos quadris, iria
correr para esse centro que portava o sexo.
Seria apenas uma pedra deformada
sob os ombros de diáfana derrocada
e como pêlos de fera não brilharia
e nem teria toda sua forma rompida
como uma estrela: lugar não haveria
que não ti veja. Precisas mudar tua vida.

Traduçâo de Karlos Rischbieter

Torso arcaico de Apolo


Não sabemos como era a cabeça inaudita,
onde as pupilas amadureciam. Glabro
no entanto o torso aclara como um candelabro,
onde apenas mais tênue, o seu olhar nos fita
e brilha. Senão como poderia o plexo
do peito assim cegar-te, e iria, no impreciso
arquear de parte da cintura, um leve riso
correr para esse centro, onde existia o sexo?
Seria um simples bloco mutilado e falto
e de seus ombros nunca o translucente salto
reluziria assim como um lombo de fera
nem romperia as órbitas qual explodida
estrela: pois ali ponto nenhum se espera
que não te veja. Tens que mudar tua vida.

Tradução de Ivo Barroso


Arrancaram tua cabeça
Mais o teu olhar nos olha profundamente
E tuas pupilas ainda se acendem nas noites
De luar
E teus lábios recitam os versos
Que ainda palpitam na musculatura
Dos teus braços
E assobiam quando cala a cotovia
Para não deixar o dia sem canção

Decerto teus cabelos dançam ao vento
Roçando as vértebras dos trigais
Tuas pálpebras ainda se contraem
Diante do rugido do mar

E tuas retinas ainda desenham
Com a resina das tuas lágrimas
As mãos que te modelaram
E escreveram na pedra
Um torso machucado
Que perdeu a cabeça
Mas que mantém o lindo olhar

E o pensamento racional
Que nos faz pensar
Que nos faz cortar com um bisturi
Abstrato
Teu corpo apolíneo
E retirar das tuas entranhas
As mais estranhas conjecturas
Versos profundos
Que sangram
E não tem suturas.


          Luiz Alfredo - poeta 

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Pupilas de Guaraná




Na floresta verde
Repleta de lendas e
Canções
Um beija-flor toma
Água adocicada numa
Exótica orquídea

Uma formiga metamorfoseia-se
Numa grande árvore
Uma lagarta dilata as pupilas
Para contemplar a hiléia
Depois vira uma borboleta
Azul

Um igarapé esverdeado
Florido de flores de sangue
Azul
Peixinhos coloridos
E iaras

Mata a sede da mata
Do antigo jabuti
Do mata - mata anta
Da nambu que canta
Da folha que encanta
Do camaleão

Acorda o dia com o vermelho
Das araras
Algazarras de cores
O guaraná abre os olhos
Encantado
Suas lágrimas alimentaram os músculos
Dos terçados
Que cortaram os roçados
O cabo das enxadas amoladas
Que arrancaram as ucas
E plantaram os grãos dourados

E um pequeno olho d’ água
Começa a bordar com seu pequeno
Fio transparente
Um oceano.


       Luiz Alfredo - poeta




quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Morada de Deus



Meu olhar contemplava aqueles montes
Com seu crepúsculo deslumbrado de cores
E aquela igrejinha pintada de cal
No vértice do horizonte
Solitária no cálice da imensidão

Seu sino badalava uma canção
Silenciosa
Seu hino entoava uma pura solidão
As negras andorinhas eram uma procissão
Naquela tarde quente de verão

Minha razão não entendia
Como Deus cabia
Naquela pequena igrejinha
Construída pelo tempo
Desgastada pelas tempestades
E pelos uivos do vento

Mas meus versos foram se tornando
Minha oração
E percebi que se Deus cabia
No meu triste coração
E nos versos da minha pobre
Poesia
Na minha ocidental razão
Bem podia caber
No interior daquela igrejinha.

                  

                               Luiz Alfredo - poeta

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

O Rio e o Tempo


Era o tempo de pura magia
As flores conversavam comigo
Como se fossemos amigos
Davam-me suas pétalas coloridas
De belas alucinações
E viajava nas sonatas dos zumbidos
Dos besouros
Nas cantigas das papoulas ao vento
Nas canções dos banzeiros
E temporais

Tempo – que tempos
Tempo em que a lua e as estrelas
Eram meus calendários
A nereida do igarapé esverdeado
Repleto de flores impressionistas
Dedilhava sua canção nas suas longas
Melenas
As orquídeas colibris e a borboleta
Azul
Ensinavam-me seus idiomas repletos
De vocábulos eternos

Era um tempo em que deixei de olhar
A linda menina dançar sua quadrilha
Para deslumbrar o céu azul
E os pássaros tecerem suas canções
Ensolaradas

Praticamente perdi meu primeiro
Amor
Mas ganhei meu primeiro verso
De Cordel
E ganhei os céus naquele papagaio
De papel

Pena que o rio e o tempo correm
E me levaram para as metafísicas
E metonímias do ocidente
Onde a Panair a coca & cola e
A Maria Fumaça
Mudaram meu horizonte...


                        Luiz Alfredo – poeta.


Papagaio de Papel no Céu de Crepom




O menino que mora dentro
De mim
Gosta de empinar papagaios
Coloridos de amarelos
E carmim
Comer manguitas nos galhos
Ingá tucumã marmelos
E escutar o belo japiim

Comer pedaços de crepúsculos
Nuvens brancas com o olhar
Como se fosse algodão doce
Pedaços de manjar

Beber raios do luar
Correr nos campos da imensidão
Comendo fagulhas de pirilampos
Mergulhando no índigo mar

É um menino danado
Digere o arco-íris nas seivas
Do cogumelo encantado
Depois fica digerindo suas cores
E outras do halo iluminado
Nas pupilas dilatadas

Digere caramelos no céu
Da boca
E passeia entre encarnadas
Papoula doidivanas
Bebendo o orvalho de suas pétalas
Deixando as pestanas
Completamente loucas

Este curumim que mora
Em mim
Vai deixando meu velho perdido
Com seu relicário
Seu canário
Seus livros no armário
Afogado no tempo do calendário
Na parede
Cheio de datas tristes
Repletos de rugas
E artrites


Ele caminha pela vida
Como se a eternidade fosse sua
E o tempo ele guarda no seu relógio
De bolso
E o cuco quando sai para cantar
Ele o ameaça que qualquer hora
Vai soltá-lo na aurora.

                 
                     Luiz Alfredo - poeta









terça-feira, 8 de outubro de 2013

Poema de Amor Grafitado








Depois que escrevi aquele poema
Pra minha donzela
Na parede de concreto do metrô
Fugi rapidamente
Deixei tudo para trás
Os sprays alguns grafites uma tira
Um broche do basquiat

Já tranqüilo nos braços dela
Senti saudade daquele poema
Que ficou sozinho
Manchado por um loco corazón
Em matura
E um gothic decadente
Pichado tremularmente
Naquela solidão fria
Apenas os lapsos de luzes
Do vagão
Clareavam algumas silabas
De paixão
Talvez algum olhar
O faça companhia pelo menos
Por uns breves momentos

Ela nem sabe do meu atrevimento
Dos meus loucos sentimentos
Na poesia escrita no cimento
Naquela estação sem primavera
Morto de saudades dela...


                Luiz Alfredo - poeta




Bicho da Eternidade



O menino que mora dentro
De mim
Gosta de empinar papagaios
Coloridos de amarelos
E carmim
Comer manguitas nos galhos
Ingá tucumã marmelos

Comer pedaços de crepúsculos
Nuvens brancas com o olhar
Como se fosse algodão doce
Pedaços de manjar

Beber raios do luar
Correr nos campos da imensidão
Comendo fagulhas de pirilampos
Mergulhando no índigo mar

É um menino danado
Digere o arco-íris nas seivas
Do cogumelo encantado
Depois fica digerindo suas cores
E outras do halo iluminado
Nas pupilas dilatadas

Digere caramelos no céu
Da boca
E passeia entre encarnadas
Papoula doidivanas
Bebendo o orvalho de suas pétalas
Deixando as pestanas
Completamente loucas

Este curumim que mora
Em mim
Vai deixando meu velho perdido
Com seu relicário
Seu canário
Seus livros no armário
Afogado no tempo do calendário
Na parede
Cheio de datas tristes
Repletos de rugas
E artrites


Ele caminha pela vida
Como se a eternidade fosse sua
E o tempo ele guarda no seu relógio
De bolso
E o cuco quando sai para cantar
Ele o ameaça que qualquer hora
Vai soltá-lo na aurora.

                 
                     Luiz Alfredo - poeta