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sábado, 21 de setembro de 2019

desvairados


Amanheceu poema
E terminou numa vela macabra
Numa chama que se apagava
Aos poucos
Num pavio sombrio ambarino
Sombrio
Queria ser poeta arcaico
Cuidar de ovelhas cabras
Nadar naquela lagoa esverdeada
Mas seria um patinho feio
Entre aqueles marrequinhos multicoloridos
Quem sabe viraria um cavalo marinho
Ou de permeio uma libélula
Fazia um pouco de frio
Folhas se desprendiam das árvores
E caiam mortas no chão
Cogumelos nasciam nas árvores apodrecidas
Orquídeas adornavam as que cresciam
Lagartas saiam das suas metamorfoses
Criavam asas e iam conhecer o infinito
O sol ia bebendo os orvalhos das flores
E abrindo as trilhas da floresta
E eu com minhas mãos trêmulas
Óculos embaçados pestanas sonolentas
Escrevia poemas desvairados
Um bardo de alaúde desafinado
Tomava um chá de pétalas frio
E os poemas destinados
Eram perdidos pelo chão
Na lata de lixo
Agora sem agasalhos olhava os pássaros
Que cantavam nos galhos
O vento soprava seus acordes nos orifícios
Do bambu
Fiz até um soneto
Um haiku
O céu agora estava azul
Mas eu estava deprimido
Tomei um comprimido
Olhei para o meu velho mido
Escutei o ruído do beta
Queria sua ração
Voltei pra sala e desliguei o computador
Estava passando o sono
As vertigens a dor
Estava voltando a ração
Bati umas clorofilas com camomilas
No liquidificador
Acendi o televisor
Mas nem olhei pro visor
Sentei-me no sofá
E comecei a delirar a sonhar
E abri bem os olhos
E comecei a ler um Zola
E sem demora dei uns goles
No suco
Comi uma colherzinha de aveia
E fiquei ali observando uma aranha
Fazendo sua teia
Para pegar sua ceia
Na televisão passava o Japão
E seu eletrônico arpão
Matando baleias
Eu até olhei para os meus caniços
E pensei deixa as sardinhas pra lá
Elas querem é viver comer e nadar
Não querem ser enlatadas
Nem ir para a frigideira
Vou pescar poemas na estante
E num instante esta lendo
Um Manuel Bandeira
Queria ser era magro tal o Gullar
E fazer uma escansão num quarteto
Depois ir escrever poemas na praia
Com José Anchieta
E se a maré estivesse cheia
Escrever versos no meu maldito
Diário
Ou em folhas mortas
Não faço versos pra que alguém
Os leia
Faço poemas pra mim
Meu beta e camaleão
Até eles ficam puto quando
Eu os declamo pra eles

                                           Aedo Lobovsly